Pavia e Joaquim Arnaud por Marco Lourenço.

Pavia e Joaquim Arnaud por Marco Lourenço.

A nossa porta de entrada no Alentejo foi Pavia, local onde desde o séc. XVII se instalaram os antepassados de Joaquim Arnaud. O Joaquim não é hoje o típico produtor, o que só pode ser um elogio. É um produtor-agricultor (palavra muito mais rara que a do “produtor-engarrafador”) que lida com porcos alentejanos (enchidos, presunto, canha do lombo), vacas (de onde vem também um invulgar presunto), ovelhas, oliveiras centenárias, pomares, cereais, e claro, as vinhas e o vinho. Sempre que possível tento conhecer melhor os produtores, pois só assim tudo o que nos escapa de um vinho nos é apresentado finalmente (ainda antes do copo nos chegar à boca, uma chatice para as provas cegas, esta declaração). Assim e desta vez, não irei falar quase nada do vinho, pois para mim é possível querer beber e gostar de algo só porque se sabe de onde vem e quem o fez (experimentem beber um Duas Quintas depois de ouvir o João Nicolau de Almeida e digam-me alguma coisa). E está lá a mão do Joaquim, o Alentejo, mas também a sua irreverência, a sua inquietação, as suas infindáveis viagens; um certo inconformismo com aquilo que pode ser feito e ainda há para fazer – aquecido a fogo com todo o peso que uma boa história sempre dá, e que ele conhece tão bem.
Às vezes parece ainda um miúdo, para quem o conhece, uma pessoa de boas maneiras que contrasta com a sua aparência de terráqueo visionário. E por isso nos mostra com todo o cuidado a casa da família, as velhas alfaias agrícolas, dois carros avariados dos anos 20, as talhas, muito e bom vinho (o espumante não é feito aqui) e um pratinho a um canto com um vinagre maravilhoso, saído de uns anexos ao lado da adega – faz tudo parte. Admiro sempre o carácter dos seus vinhos, imprecisos, cheios, profundos – e voltamos ao mesmo, poderia estar a falar do Joaquim – há ali vinhos que para já só têm números que são tremendos, que vão sair quando a conhecida pressa alentejana decidir. 
Na casa de banho da casa onde mais tarde almoçámos encontrei a revista Carne e não a Caras, e também nunca irei esquecer aquela simples laranja cortada regada com azeite no final da refeição… Coisas tão boas, porque simples, porque boas.

Acerca

cegosprovas

Os Cegos por Provas nasceram através da plataforma Facebook, apaixonados pelo vinho, o grupo desenvolve vários eventos vínicos a nível nacional.

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