Quinta Madre de Água

Quinta Madre de Água

A serra da Estrela domina o horizonte de quem se aproxima da Quinta Madre de Água. Situada no sopé desta serra, junto à aldeia de Vinhó, a escassos 5 quilómetros de Gouveia e a 20 quilómetros da Torre, a propriedade espraia-se num vale comprido, onde a água serrana escorre por entre afloramentos rochosos da era glaciar que emergem no meio de terras férteis, pastos e árvores, muitas delas centenárias, com predominância para as oliveiras, os carvalhos, os castanheiros e os pinheiros.
Chegar à Madre de Água é perceber que, mais do que perante um projecto empresarial, estamos face a um projecto de amor dos seus proprietários, Luís e Lurdes Perfeito, os quais decidiram regressar às suas origens em 2007 e iniciar um sonho de vida, aliando o empreendedorismo com a sua paixão pelas raízes, pela natureza e pelas artes e tradições da sua terra. Assim, após adquirirem e começarem a explorar as potencialidades da Quinta Madre de Água (que dá o bonito nome ao projecto e inspira os cristais de água do seu logotipo), construíram aí um hotel de charme com 10 quartos e um restaurante e, paulatinamente, foram abraçando novos desafios, aumentando, para esse efeito, a área dos terrenos, a qual, com a aquisição das vizinhas Quintas de Santo António, Regada, Caramuja e Nossa Senhora do Porto, passou dos 16 hectares iniciais para os actuais 60 hectares.
Após simpática recepção, começamos a percorrer, por entre vinhas, prados e pomares, os diferentes espaços da propriedade, logo sendo surpreendidos pela abundante presença dos animais que ali vivem, em perfeita harmonia com a natureza envolvente. Apaixonada pela causa animal, a proprietária Lurdes vem recolhendo cada vez mais cães perdidos, muitos de raça Serra da Estrela, albergando já na quinta várias dezenas deles que, acomodados em funcionais canis, emprestam a sua beleza aos espaços amplos por onde deambulam. Paralelamente, o casal Perfeito, depois de surgir a possibilidade de ficar com um rebanho de ovelhas bordaleiras de um pastor da região, lançou mãos à construção de um ovil, uma sala de ordenha e uma queijaria, contando hoje em dia com mais de 450 ovelhas e 150 cabras para, em instalações modernas e sob o cuidado de mãos dedicadas e sabedoras de trabalhadoras locais, produzir o afamado queijo da Serra da Estrela. Os proprietários investiram também na criação de cavalos de pura raça Lusitana, bem como na sua preparação para competições equestres, instalando na quinta uma coudelaria que possui instalações perfeitamente integradas na paisagem e dispõe de um espaçoso picadeiro coberto.
Neste quadro de plena interligação entre o homem, a natureza e os animais, o projecto Madre de Água integra ainda a exploração de pomares e a produção de compotas caseiras, bem como a produção de azeite dos seus olivais e, claro, a produção de vinho. As vinhas – algumas com idades compreendidas entre 15 e 40 anos, outras já plantadas após a aquisição dos terrenos – encontram-se situadas a 600 metros de altitude, ocupando actualmente cerca de 15 hectares de solos graníticos de uma área cujo subsolo é particularmente rico em lençóis freáticos. Existem cepas de castas brancas (Encruzado, Verdelho/Gouveio, Bical e Semillon) e de castas tintas (Tinta Roriz, Touriga Nacional, Alfrocheiro, Jaen, Merlot, Syrah e Cabernet Sauvignon), não se procedendo, por opção enológica, à sua rega. Após trabalhos de preparação das vinhas e experiências iniciais, somente a partir de 2015 é que começaram a ser lançadas as primeiras colheitas. As uvas são vindimadas manualmente e vinificadas numa adega alugada em Penalva do Castelo. Todavia, está já a ser projectada a construção na Quinta da Caramuja de uma nova adega, mediante a recuperação e ampliação de uma adega centenária lá existente, com aproveitamento também de todo o espaço a criar para actividades de enoturismo.


Terminada a visita à propriedade, a enóloga da equipa de viticultura e enologia liderada por Paulo Nunes conduziu uma prova de vinhos do portefólio Madre de Água no moderno restaurante do Hotel Rural, explicando previamente que, no âmbito de uma recente remodelação da imagem da marca, havia sido adoptada a designação “Terras” (Madre de Água) para os vinhos Colheita (branco e tinto) e os monovarietais de Encruzado e Touriga Nacional, reservando-se a designação “Quinta Madre de Água” para vinhos de gama superior e a utilização do nome “Experimentum” para projectos mais experimentais desenvolvidos pela equipa, nomeadamente com as castas não autóctones existentes nas vinhas. Começaram então a desfilar perante nós os diversos vinhos, sendo a sua prova excelentemente acompanhada por pão de três variedades e deliciosos queijos, compotas e azeites produzidos na quinta.
Em primeiro lugar foi servido o Colheita Branco 2016, elaborado com uvas das castas Encruzado, Verdelho, Bical e Semillon. Com aromas frescos e cítricos, apresenta boa acidez e boa estrutura. Vinificado sem contacto pelicular e fermentado a temperatura controlada, é um excelente representante do universo dos vinhos Madre de Água.
Seguiu-se o Rosado 2016. Com 50% de Touriga Nacional e 50% de Alfrocheiro, possui uma cor salmonada (“à La Provence”) e é seco e leve. Na boca, sente-se um toque vegetal que permite experimentar o seu consumo não apenas com aperitivos.
Após, foi a vez de ser servido o Encruzado 2017, recentemente engarrafado e ainda não lançado no mercado. Fermentado e estagiado em cubas de inox, apresenta alguma expressividade no nariz, ainda assim sem deixar de ser delicado e elegante. Com excelente acidez, é mineral e persistente na boca. Nos tintos, as hostilidades foram abertas com o Colheita 2014. Elaborado com base num blend típico de Touriga Nacional, Tinta Roriz, Alfrocheiro e Jaen, é aromaticamente bastante apelativo, ostentando um bouquet onde se salientam algumas notas de fruta madura. Na boca, apresenta uma textura equilibrada, transmitindo uma sensação de frescura com traços herbáceos leves e suaves. Muito agradável. De seguida, foi a vez de se degustar o Touriga Nacional 2012, um monovarietal em que 20% do seu lote final estagiou em barricas de carvalho francês. No nariz, emergiu um ambiente de aromas mais especiados, ainda que acabassem também por aparecer sugestões das notas florais típicas da casta. Ao nível do paladar, sobressaíram, num conjunto com volume e de boa envolvência taninosa, os sabores silvestres. O vinho tinto seguinte foi servido “às cegas”, logo se revelando um desafio bem curioso para os presentes, face à sua cor pouco viva, à delicadeza dos seus aromas e a um corpo cuja fragilidade aparente cedo revelou esconder um carácter bem vincado. Após terem sido aventadas algumas hipóteses, foi revelado estarmos perante o Experimentum Syrah 2016, um vinho monovarietal parcialmente estagiado em barrica que surpreendeu pela subtileza da sua intensidade, assente numa boa acidez e em taninos finos mas bem presentes e de inegável classe. Por se tratar de um vinho que resultou de uma nova abordagem enológica, foi trazido de seguida para a mesa o Experimentum Syrah 2012, dando-se assim a todos os presentes a oportunidade de aferir os seus gostos pessoais, comparando dois vinhos elaborados a partir de uvas da mesma casta e das mesmas vinhas, mas de perfis bastante distintos. Por fim, foi provado mais um vinho da gama Experimentum, o Merlot 2016, outro monovarietal parcialmente (40%) estagiado em barricas de carvalho francês. Com intensidade aromática média, honrou o carácter elegante e fresco dos vinhos Madre de Água, revelando na boca um corpo equilibrado e envolvente, algumas notas de fruta de bosque e boa persistência.
Terminada a prova, ficamos entregues ao chef Filipe Pinto, o qual nos deliciou com uma saborosa entrada de folhado de queijo com mel, um cabrito “de leite” soberbo e uma sobremesa de maçã com gelado de canela e vinho do porto.
Feitas as despedidas, saímos da Madre de Água com um sentimento muito especial que não sabemos descrever, mas que temos a certeza que invade o espírito de todos aqueles têm o privilégio de, em pleno ambiente natural, contactar com o projecto de paixão genuína que lá se desenvolve.

Texto escrito por J.N. Duarte

Categorias Wine Experience

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Os Cegos por Provas nasceram através da plataforma Facebook, apaixonados pelo vinho, o grupo desenvolve vários eventos vínicos a nível nacional.

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